“XADREZ É SIMPLES”, afirmou Elon Musk em uma entrevista.
Acho que sou um dos poucos jogadores de xadrez que concordam com a afirmação polêmica do Sr. Musk.
O xadrez considerado “clássico”, a variante hegemônica do antigo Xatranje dos persas que por sua vez era uma variante do ainda mais antigo Chaturanga indiano, é realmente muito simples.
As regras básicas são elementares.
Há apenas seis peças diferentes.
O tabuleiro é limitado a uma área de 8×8 casas.
E o xeque-mate, o objetivo final da partida que pode ser aplicado de maneiras desconhecidas, tornou o xadrez em um “não-jogo” (mais sobre este problema neste artigo: Illusory checkmates: why chess is not a game).
O que assistimos desde o século 19, são jogadores de prodigiosa memória fotográfica decorando dezenas de aberturas até o vigésimo lance ou mais para se prepararem antes de um torneio. E a CRIATIVIDADE, parafraseando Bobby Fischer, ficou em último lugar…
Enxadristas famosos antes de Fischer já ousaram questionar o xadrez ortodoxo, como Lasker e Capablanca. Para Lasker, o xadrez deveria ser um ramo da matemática, e Capablanca previu o número crescente e alarmante de empates entre especialistas…
E em 1997 o cérebro humano foi posto em xeque com o advento dos supercomputadores de Inteligência Artificial (vide Kasparov vs Deep Blue).
No vídeo acima, o riso nervoso do GM Nakamura diante das constatações de Musk revela que isso já é sabido pela elite do xadrez. Porém, ninguém ousou mexer na galinha de ovos de ouro deles.
Outros mestres e pesquisadores do xadrez também admitem que o xadrez é limitado a umas poucas aberturas e defesas realmente eficazes.
Quanto à vantagem inicial das Brancas, esse é um problema de desigualdade que ninguém ainda solucionou (o que explica porque nenhuma engine consegue repetidas vitórias com as Pretas nos campeonatos entre máquinas).
O fato é que esta variante é uma simplificação das batalhas do passado que sequer chega aos pés das guerras tecnológicas de Quinta Geração que estamos presenciando desde a bomba atômica.
Xadrez clássico é simples e anacrônico. E, ecoando o desabafo recente do GM Magnus Carlsen, “estressante e entediante”…
Este é o diagnóstico do atual estado decadente em que se encontra o xadrez. Uma das causas é a organização FIDE (os GMs Kasparov e Kramnik já nos alertaram!) que embalsamou o xadrez e interrompeu o seu fluxo natural de evolução. Monopolizar o xadrez deveria ser considerado um crime contra um patrimônio cultural da humanidade, mas todos que ousaram lutar contra esta máfia foram derrotados. Dinheiro sempre vence.
Fischer foi um destes guerreiros corajosos que tentou resgatar o potencial original dos enxadristas com uma variante de 960 subvariantes embutidas. E a sua primeira tentativa de organizar um campeonato mundial de Fischer Random Chess foi sabotada porque qual Grande-Mestre consolidado gostaria de jogar – e de arriscar ser derrotado – em território novo?
A culpa, no entanto, não está restrita aos que lucram com a estagnação do xadrez.
São os próprios enxadristas que estão ajudando a matar o xadrez que tanto idolatram.
E isso não é contraditório. E fácil de explicar.
Um exemplo:
— Quantas variantes de xadrez você está jogando atualmente?
De milhares de jogadores, talvez uma dezena deles irá responder que também joga esporadicamente o Chess960…
O que esta geração continua fazendo é atrasar a evolução do xadrez, agregando um vínculo emocional que os deixa cegos para reconhecer as vantagens de se jogar uma variante melhor e mais completa do que a que aprenderam com seus familiares queridos.
Mas é assim que a mentalidade de pensamento de rebanho funciona e não adiante apresentar argumentos lógicos e racionais onde imperam os sentimentalismos e os compromissos financeiros.
Para ser justo, há duas variantes do xadrez que estão se alastrando como uma verdadeira epidemia, o Blitz e o Bullet, os quais são excelentes para manter os jogadores medianos dopados com a adrenalina da corrida contra o relógio. Como ironizou certa vez um GM russo quando lhe perguntaram se ele já havia jogado xadrez rápido: “Sim, em um trem.”
Enfim, o xadrez ortodoxo ESTÁ simples e simplista porque todas as tentativas de melhorá-lo foram e estão sendo ignoradas tanto pelos políticos e comerciantes quanto pelos jogadores profissionais que lucram com tal estado de estagnação e por uma geração inteira apegada emocionalmente ao “vintage” (conforme ficou bem evidente na cultuada série “O Gambito da Rainha”).
O xadrez não será salvo pela FIDE e nem por algum Grande-Mestre ou pelos Youtuber$.
O xadrez será salvo por jogadores amadores que realmente aplicarem a lógica e a racionalidade matemática nas suas partidas e que ousarem experimentar a mais nova das variantes que será a sucessora do velho xadrez.
O xadrez está morto! Viva o xadrez!
P.S.: um leitor deste artigo alegou que o xadrez está em uma ascensão global com milhares de crianças e jovens aprendendo a jogar. Expliquei que o argumento dele era uma falácia. Popularização não significa um crescimento mundial do xadrez. Na China, Japão e em vários países europeus o xadrez está perdendo seu apelo, porque no Sudeste Asiático há o Gô e outros jogos de tabuleiro tradicionais, e a juventude europeia está preferindo os videogames e o Póquer. Quanto ao xadrez que as crianças e jovens estão aprendendo na Índia e nas Américas (entre outros países de “Terceiro Mundo”), continua sendo um xadrez incompleto e anacrônico demais para educar mentes que nasceram após a revolução digital (se é que educação faz parte da agenda desses governantes). Como dizem nos tribunais, não tenho nada mais há declarar.
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